segunda-feira, 3 de junho de 2013

A magia do Alentejo e dos alentejanos


Palavra mágica que começa no Além e termina no Tejo.
O rio que divide e une Portugal e que à semelhança do
Homem Português, que fugiu de Espanha à procura
do mar.
O Alentejo molda o carácter de um homem.
A solidão e a quietude da planície dão-lhe a
espiritualidade,a tranquilidade e a paciência do monge;
as amplitudes térmicas e a agressividade da charneca
dão-lhe a resistência física, a rusticidade, a coragem e
o temperamento do guerreiro.
Não é alentejano quem quer.
Ser alentejano não é um dote, é um prazer, é um dom.
Não se nasce alentejano, é-se alentejano.
Portugal nasceu no Norte mas foi no Alentejo que se
fez Homem.
Guimarães é o berço da Nacionalidade, Évora é o berço
do Império Português.
Não foi por acaso que D. João II se teve de refugiar em
Évora para descobrir a Índia.
No meio das montanhas e das serras um homem tem
as vistas curtas; só no coração do Alentejo, um homem
consegue ver ao longe.
Mas foi preciso Bartolomeu Dias regressar ao reino
depois de dobrar o Cabo das Tormentas, sem
conseguir chegar à Índia, para D. João II perceber que
só o costado de um alentejano conseguia suportar com
o peso de um empreendimento daquele vulto.
Aquilo que para o homem comum fica muito longe, para
um alentejano fica já ali.
Para um alentejano não há longe, nem distância porque
só um alentejano percebe intuitivamente que a vida não
é uma corrida de velocidade, mas uma corrida de
resistência onde a tartaruga leva sempre a melhor
sobre a lebre.
Foi, por esta razão, que D. Manuel decidiu entregar a
chefia da armada decisiva a Vasco da Gama.
Mais de dois anos no mar...
E, quando regressou, ao perguntar-lhe se a Índia era
longe, Vasco da Gama respondeu: «Não, é já ali.».
O fim do mundo, afinal, ficava ao virar da esquina.
Para um alentejano, o caminho faz-se caminhando e
só é longe o sítio onde não se chega sem parar de andar.
E Vasco da Gama limitou-se a continuar a andar onde
Bartolomeu Dias tinha parado.
O problema de Portugal é precisamente este: muitos
Bartolomeu Dias e poucos Vasco da Gama.
Demasiada gente que não consegue terminar o que
começa, que desiste quando a glória está perto e o mais
difícil já foi feito.
Ou seja, muitos portugueses e poucos alentejanos.
D. Nuno Álvares Pereira, aliás, já tinha percebido isso.
Caso contrário, não teria partido tão confiante para
Aljubarrota.
D. Nuno sabia bem que uma batalha não se decide pela
quantidade mas pela qualidade dos combatentes.
É certo que o Rei de Castela contava com um poderoso
exército composto por espanhóis e portugueses, mas
o Mestre de Avis tinha a vantagem de contar com
meia-dúzia de alentejanos.
Não se estranha, assim, a resposta de D. Nuno aos
seus irmãos, quando o tentaram convencer a mudar
de campo com o argumento da desproporção numérica:
«Vocês são muitos? O que é que isso interessa, se os
alentejanos estão do nosso lado?»
Mas os alentejanos não servem só as grandes causas,
nem servem só para as grandes guerras.
Não há como um alentejano para desfrutar plenamente
dos mais simples prazeres da vida.
Por isso, se diz que Deus fez a mulher para ser a
companheira do homem.
Mas, depois, teve de fazer os alentejanos para que as
mulheres também tivessem algum prazer.
Na cama e na mesa, um alentejano nunca tem pressa.
Daí a resposta de Eva a Adão quando este, intrigado,
lhe perguntou o que é que o alentejano tinha que ele
não tinha: «Tem tempo e tu tens pressa.»
Quem anda sempre a correr, não chega a lado nenhum.
E muito menos ao coração de uma mulher.
Andar a correr é um problema que os alentejanos,
graças a Deus, não têm.
Até porque os alentejanos e o Alentejo foram feitos
ao sétimo dia, precisamente o dia que Deus tirou
para descansar.
E até nas anedotas, os alentejanos revelam a sua
superioridade humana e intelectual.
Os brancos contam anedotas dos pretos, os
brasileiros dos portugueses, os franceses dos
argelinos... só os alentejanos contam e inventam
anedotas sobre si próprios.
E divertem-se imenso, ao mesmo tempo que servem
de espelho a quem as ouve.
Mas para que uma pessoa se ria de si própria não
basta ser ridícula porque ridículos todos somos.
É necessário ser inteligente e ter sentido de humor.
Só que isso é um extra só disponível nos seres
humanos topo de gama.
Não se confunda, no entanto, sentido de humor com
alarvice.
O sentido de humor é um dom da inteligência; a
alarvice é o tique da gente bronca e mesquinha.
Enquanto o alarve se diverte com as desgraças alheias,
quem tem sentido de humor ri-se de si próprio.
Não há maior honra do que ser objecto de uma boa
gargalhada.
O sentido de humor humaniza as pessoas, enquanto
a alarvice diminui-as.
Se Hitler e Estaline se rissem de si próprios, nunca
teriam sido as bestas irracionais que foram.
E as anedotas alentejanas são autênticas pérolas de
humor: curtas, incisivas, inteligentes e desconcertantes,
revelando um sentido de observação, um sentido
crítico e um poder de síntese notáveis.
Não resisto a contar a minha anedota preferida.
Num dia em que chovia muito, o revisor do comboio
entrou numa carruagem onde só havia um passageiro,
por sinal, um alentejano que estava todo molhado, em
virtude de estar sentado num lugar junto a uma
janela aberta.
«Ó amigo, por que é que não fecha a janela?»,
perguntou-lhe o revisor.
«Isso queria eu, mas a janela está estragada.»,
respondeu o alentejano.
«Então por que é que não troca de lugar?»
«Eu trocar, trocava... mas com quem?»
Como bom alentejano que me prezo de ser, deixei o
melhor para o fim.
O Alentejo, como todos sabemos, é o único sítio do
mundo onde não é castigo uma pessoa ficar a pão e água.
Água é aquilo por que qualquer alentejano anseia.
E o pão...
Mas há melhor iguaria do que o pão alentejano?
O pão alentejano come-se com tudo e com nada.
É aperitivo, refeição e sobremesa.
E é o único pão do mundo que não tem pressa de ser
comido.
É tão bom no primeiro dia como no dia seguinte ou
no fim da semana.
Só quem come o pão alentejano está habilitado para
entender o mistério da fé.
Comê-lo faz-nos subir ao Céu!
É por tudo isto que, sempre que passeia pela charneca
numa noite quente de verão ou sente no rosto o frio
cortante das manhãs de Inverno, dá graças a Deus por
ser alentejano.
Que maior bênção poderia um homem almejar?





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